Conheci a mãe dele antes dele nascer.
Éramos conhecidas desde quando ela vinha buscar a irmãzinha na escola, da qual eu era a professora.
Ela cresceu, seguiu seu caminho e eu também mudei de escola e segui o meu.
Depois de muitos anos a encontrei num balcão de uma loja, da qual ela era vendedora.
Conversávamos muito quando eu ia lá e num certo dia fiquei sabendo que ela iria se casar. Estava esperando um bebê.
Soube que ela se casara, saiu da loja e nunca mais a vi.
Certo dia, retornando na loja, soube que ela havia falecido.
Assustei.
Por coincidência, a mãe dela trabalhava como merendeira na mesma escola que eu e ela me contou o ocorrido.
Contou que o menino estava com ela e que ela cuidaria dele.
O choque foi grande e eu nunca me esqueci do rosto daquela moça toda feliz, me dizendo que iria ser mãe.
As coincidências não pararam aí.
Neste ano, olha quem está na minha lista de alunos? O menino, filho daquela moça.
Contei a ele o quanto eu estava feliz por tê-lo conhecido, pois conheci a mãe dele e gostava muito dela.
Contei para ele que conheci o pai por foto, que conhecia a avó e o avô. Contei até que conheci o bisavô dele.
Os olhinhos do menino brilhavam.
O ano foi passando, a pandemia atrapalhou muito os estudos dele, porém em agosto ele retornou à escola e estamos juntos até hoje.
Ontem, ele me pediu um curativo para colocar no dedo, pois uma pele havia levantado e ele arrancou, ferindo.
Não tem nada na escola que pudesse colocar ali, então improvisei um curativo com papel higiênico e durex e orientei que ele pedisse ao avô que comprasse uma pomadinha milagrosa, que curava qualquer ferimento.
Hoje, o menino estava estranho e o colega me disse que ele estava chorando.
Perguntei o motivo e ele disse que era dor no dedo. Não conseguia fazer a tarefe.
Eu brinquei e disse que ele deveria estar com dor em outro lugar, pois o dedo não iria doer tanto a ponto de impossibilitar o manuseio do lápis.
O menino escreve fraco, quase não se consegue ler o que ele escreve e isso já demonstra que ele é tímido e retraído.
Ele me trouxe a tarefa três vezes e eu pedi que ele, as três vezes, apertasse mais o lápis, pois eu não conseguia ler o nome dele.
Que coisa! Na terceira vez o menino chorou tanto, tanto, tanto, que eu o levei lá fora e chorei junto.
O abracei e ele num abraço bem forte, soluçava muito.
Percebi o quanto ele estava carente e triste.
A dor do dedo era apenas uma desculpa para transbordar a dor da alma.
O abraço na professora foi de cura.
Ele, sem saber, me deu o abraço que eu estava precisando.
Um abraço cheio de vontade de carinho, cheio de vontade de doar afeto, amor.
A troca no abraço curou a dor da alma do aluno e da professora.
Foi triste, mas foi bom...